Monte Mor de Antanho - Causos -17
A missa.
Genor e Beínha eram irmãos. Solteiros, nunca se separaram, mesmo depois da morte dos pais. Quando estavam bem velhos foram internados no asilo local. Pobres, simples, analfabetos, os dois eram muito conhecidos na cidade.
A casinha branca pelo cal que cobria as paredes de taipa de mão, rebocadas com estrume de gado, agarrado ao emaranhado de bambus e cipós, telhado sustentado por caibros e vigas de pau roliço de madeiras de pouca valia, telhas feitas nas coxas, uma das paredes escoradas por um galho de goiabeira, era o palácio construído pelos pais de Genor e Beínha. Ali morava a felicidade de quem não conhecia os desmandos da idiotice humana.
Nunca conheci o interior daquela casa, mas com o perdão de Deus, pelo julgamento que agora faço, baratas e outros seres não muito simpáticos, deviam conviver com eles. Essa minha conclusão tem seu fundamento no caso que agora exponho:
Genor era católico e costumeiramente freqüentava a igreja. Como naquela época nenhum fiel adentrava um templo, durante as cerimônias religiosas, sem portar um terno, mesmo nos dias mais quentes do ano, ainda que fosse confeccionado com o pesado tecido conhecido por casimira, lá foi nosso personagem assim vestido, para assistir à missa do domingo. Sapato preto, sola enlameada pelo barro das ruas, resultado da chuva que caíra no dia anterior, e chapéu na mão, porque entrar na igreja com chapéu na cabeça era visto como um grave desrespeito à casa de Deus. Aliás, o chapéu era um assessório que fazia parte do bom vestir e praticamente todo homem trazia-o sobre a cabeça, mas era de bom alvitre tirá-lo sempre ao entrar numa residência ou numa loja ou em uma repartição qualquer.
O terno, azul claro, meio desbotado pelo uso, um pequeno remendo na perna esquerda da calça, os bolsos do paletó com marcas enegrecidas nas bordas e uma gravata carijó amarrada no colarinho encardido da camisa quase branca.
Na igreja, permaneceu em pé, encostado a uma das colunas sustentadora do prédio, já que o salão estava repleto de fiéis. Passado algum tempo, Genor começou a se mexer. Mexe, remexe, sacode pra cá, sacode pra lá, se torce todo. As pessoas que assistiam a cena começaram a se preocupar. Os que estavam mais próximos trataram de se afastar enquanto o Genor se chacoalhava todo. Depois de tantos trejeitos solta o braço direito com toda sua força expulsando da manga de seu paletó, uma pré-histórica barata. O inseto alça vôo e se acomoda no branco véu que cobria a cabeça de uma beata concentrada no jenuflexório logo à frente do padre. A “veia” deu um grito, acordando todo o povo que fingia assistir a missa. O sacristão tenta matar o bicho, o coroinha enrosca o pé e cai derrubando uma vela acesa, pega fogo na tolha do altar, aí a festança foi geral. A missa acabou mais cedo.
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