Wednesday, November 24, 2010

Monte Mor de Antanho - Causos - 15

Os galos : duas histórias

Primeira

Éramos crianças. Certo dia chuvoso, eu, meu irmão e um primo encontramos um pintinho todo molhado e prá morrer de frio. Morreria mesmo. Cuidamos dele. Aquecido e alimentado, recuperou as forças, cresceu, virou galo. Todos os dias, desde aquele primeiro, nós o enrolávamos em um pano e o colocávamos em uma caixa de sapatos para dormir. Acostumou mal. O tempo passou, virou franguinho, depois frangão e finalmente tornou-se um belo galo, forte, colorido, garboso. Crista carnuda, asas curtas e um invejável par de esporas. Apesar de toda sua pompa, era carinhoso, cheio de dengo e nunca perdeu o vício de dormir enrolado em um pano. Para facilitar arrumamos um saco de estopa com o qual o envolvíamos. A todo entardecer lá vinha o emplumado buscando seu saco de dormir.

Gostava de humanos, deixava seus pares para acompanhar a gente. Morávamos em uma chácara e a galinhada vivia solta pelo quintal. Bastava aparecer alguém e nosso amigo já lhe fazia companhia. Estava sempre procurando carinho e calor humano.

Nessa época meus pais, em todas as manhãs dirigiam-se ao curral para ordenhar algumas vacas. Imagine quem os acompanhava? Foi o grande erro do galo. Certo dia, enquanto meu pai tirava o leite da Calçada, bela vaca holandesa, que produzia mais de dez litros de leite por dia, minha mãe cuidava do bezerro, o galo passeava por entre os animais. Aí aconteceu a tragédia. Uma vaca distraída pisou-lhe o pescoço. Morreu na hora.

Enterramos nosso amiguinho no fundo do quintal, perto da última mangueira, onde jaziam o meu cachorrinho Lulu, que morreu engasgado por uma cabeça de peixe cascudo, duas angolinhas que não vingaram e o tuim que o gato matou. Sobre o túmulo coloquei uma pequena cruz feita com lascas de bambu enfeitada com pequeninas flores silvestres que colhi ali perto, debaixo das goiabeiras.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home